segunda-feira, 28 de março de 2011

EXISTENCIAL IDADES - Sobre engrenagens

E o minino, assombrado, olha para o irmão e diz:
 - Tonho, olhe, olhe: Os bois estão rodando sozinhos!
Lá estavam eles: automatizados...
Giravam, giravam, giravam como se fossem apenas mais uma peça daquilo tudo.
E para engrenagem girar, não era mais preciso chicotear os bois.
[Pescado do filme "Abril despedaçado" de Walter Salles]

Mix de cenas dos filmes 1984 e Abril despedaçado e big brother Brasil


sábado, 19 de março de 2011

INCONFORMAL IDADES: Entrevista com Raoul Vaneigem

Excertos da entrevista de Hans Ulrich Obrist a Raoul Vaneigem em Agosto deste ano para a revista e-flux. A entrevista era bastante extensa e por isso o tradutor optou por traduzir apenas algumas partes relevantes.

Hans Ulrich Obrist: Acabei de visitar Edouard Glissant [escritor, poeta, romancista, teatrólogo e ensaísta francês] e Patrick Chamoiseau [escritor francês], que escreveram um apelo a Barack Obama. Qual seria o teu apelo ou conselho a Obama?
Raoul Vaneigem: Recuso-me a cultivar qualquer tipo de relação com pessoas de poder. Concordo com os Zapatistas de Chiapas que não querem ter nada a ver nem com o Estado nem com os seus chefes, as máfias multinacionais. Eu proponho a desobediência civil de forma que as comunidades locais possam formar, coordenar e começar a auto-produzir poder natural, uma forma de cultivo mais natural e serviços públicos finalmente libertos dos esquemas do governo quer seja de direita ou de esquerda. Por outro lado, dou as boas-vindas ao apelo de Chamoiseau, Glissant e os seus amigos para a criação de uma existência em que a poesia de uma vida redescoberta coloque um fim ao estrangulamento mortal da mercadoria.
[...]
Hans Ulrich Obrist: A Internacional Situacionista definiu o situacionista como alguém que se compromete a construir situações. Que eram essas situações para ti, concretamente? Como definirias o projecto situacionista em 2009?
Raoul Vaneigem: Pelo seu próprio estilo de vida e de pensamento, o nosso grupo estava já a esboçar uma situação, como um primeiro desembarque em pleno território inimigo. A metáfora militar é questionável, mas transmite a nossa vontade em libertar a vida diária do controlo e estrangulamento de uma economia baseada na exploração lucrativa do homem. Nós formamos um grupo-em-risco que estava consciente da hostilidade do mundo dominante, da necessidade de ruptura radical, e do perigo de ceder à paranóia típica das mentes sob cerco. Mostrando os seus limites e as suas fraquezas, a experiência situacionista também pode ser vista como uma meditação crítica sobre o novo tipo de sociedade esboçada pela Comuna de Paris, o movimento Makhnovista e a República de Conselhos dizimada por Lenine e por Trotsky, pelas comunidades libertárias em Espanha mais tarde esmagadas pelo Partido Comunista. O projecto situacionista não é acerca do que acontece assim que a sociedade de consumo é rejeitada e uma sociedade humana genuína emerge. Ao invés, ele esclarece agora como a vida pode suplantar a sobrevivência, o comportamento predatório, o poder, o comércio e o reflexo-de-morte.
[...]
Hans Ulrich Obrist: Escreveste muito sobre a vida, não sobre a sobrevivência. Qual é a diferença?
Raoul Vaneigem: Sobrevivência é vida orçamentada. O sistema de exploração da natureza e do homem, a partir do Neolítico Médio com a agricultura intensiva, causou uma involução em que a criatividade – uma qualidade específica dos seres humanos – foi suplantada pelo trabalho, pela produção de um poder avarento. A vida criativa, como se começou a desenvolver durante o Paleolítico, declinou e deu lugar a uma luta brutal pela subsistência. A partir de então, a predação, que define o comportamento animal, tornou-se o gerador de todos os mecanismos econômicos.
[...]
Hans Ulrich Obrist: No seu livro «Making Globalization Work», Joseph Stiglitz defende uma reorganização da globalização no sentido de trazer maior justiça, a fim de diminuir os desequilíbrios mundiais. O que achas da globalização? Como é que nos podemos livrar do lucro como motivação e em vez disso procurar o bem-estar? Como é que nos livramos do imperativo do crescimento?
Raoul Vaneigem: A moralização do lucro é uma ilusão e uma fraude. Tem de haver uma ruptura definitiva com um sistema económico que tem sistematicamente propagado a ruína e a destruição ao mesmo tempo que pretende, por entre a miséria generalizada, produzir um hipotético bem-estar. As relações humanas devem substituir e terminar com as relações comerciais. A desobediência civil significa desrespeitar as decisões de um governo que defrauda os seus cidadãos para apoiar o desfalque do capitalismo financeiro. Para quê pagar impostos ao estado-banqueiro, impostos usados em vão para tentar tapar o ralo da corrupção, quando pelo contrário podemos direccioná-los para a auto-gestão de redes de energia livre em cada comunidade local? A democracia directa de conselhos auto-geridos tem todo o direito de ignorar os decretos da democracia parlamentar corrupta. A desobediência civil a um Estado que nos está a saquear é um direito. Cabe-nos aproveitar esta mudança histórica para criar comunidades onde o desejo pela vida supere a tirania do dinheiro e do poder. Não precisamos de nos preocupar nem com a dívida pública, que encobre uma enorme fraude no interesse público, nem com o artifício do lucro a que eles chamam de “crescimento.” De agora em diante, o objetivo das comunidades locais deve ser o de produzir para si próprias e para si próprias todos os bens de valor social, atendendo às necessidades de todos – necessidades autênticas, isto é, não as necessidades pré-fabricados pela propaganda consumista.
Hans Ulrich Obrist: Edouard Glissant distingue entre globalidade e globalização. A globalização elimina as diferenças e homogeneíza, enquanto globalidade é um diálogo global que produz diferenças. O que achas da sua noção de globalidade?
Raoul Vaneigem: Para mim, deve significar agir localmente e globalmente através de uma federação de comunidades em que a nossa democracia parlamentar desviadora de fundos e corrupta é tornada obsoleta pela democracia direta. Conselhos locais serão criados para tomar medidas que favoreçam o meio ambiente e a vida quotidiana de todos. Os situacionistas chamaram a isto “criar situações que excluam qualquer retrocesso.”
[...]
Hans Ulrich Obrist: No seu livro «Utopistics», Immanuel Wallerstein afirma que o nosso sistema mundial está a passar por uma crise estrutural. Ele prevê que serão necessários mais vinte a cinquenta anos para um sistema mais democrático e igualitário substituir este. Ele acredita que o futuro pertence a instituições «desmercantilizadas» e livres de custo (segundo o modelo, digamos, das bibliotecas públicas). Portanto, devemos opor-nos à mercantilização da água e do ar. Qual é a tua opinião?
Raoul Vaneigem: Não sei quanto tempo levará a transformação actual (esperemos que não muito, pois gostaria de a presenciar). Mas não tenho dúvidas que esta nova aliança com as forças da vida e da natureza disseminará igualdade e gratuidade. Devemos ultrapassar a nossa indignação natural pela apropriação lucrativa da nossa água, ar, solo, meio ambiente, plantas e animais. Devemos criar colectivos capazes de gerir os recursos naturais em benefício dos interesses humanos, não dos interesses do mercado. Este processo de reapropriação que eu prevejo tem um nome: auto-gestão, uma experiência tentada muitas vezes em contextos históricos hostis. Neste altura, dada a implosão da sociedade de consumo, parece ser a única solução tanto do ponto de vista individual como social.
[...]
Hans Ulrich Obrist: Poderias falar sobre o princípio da gratuitidade (estou extremamente interessado nisso; como curador de museu sempre acreditei que os museus devem ser livres – Arte para Todos, como Gilbert e George o colocam).
Raoul Vaneigem: Gratuitidade é a única arma capaz de despedaçar a poderosa máquina de auto-destruição posta em movimento pela sociedade de consumo, cuja implosão está ainda a libertar, como um gás mortal, mentalidade de sovina, cupidez, ganho financeiro, lucro e predação. Museus e cultura devem ser livres, concerteza, mas também o deviam ser os serviços públicos, actualmente presos aos esquemas das multinacionais e estados. Comboios gratuitos, autocarros, metros, cuidados de saúde, escolas livres, água livre, ar, electricidade, energia livre, tudo através de redes alternativas a serem criadas. À medida que a gratuitidade se espalha, novas redes de solidariedade erradicam o estrangulamento da mercadoria. Isto porque a vida é uma dádiva gratuita, uma criação contínua que a vil especulação do mercado nos priva.

quarta-feira, 16 de março de 2011

FEMINIL IDADES: LILY BRAUN


Lily Braun, nascida em 02 de julho de 1865 em Halberstadt, e morreu em 8 de agosto de 1916 em Berlim), foi uma escritora feminista alemã.
Seu pai era o prussiano, general Hans von Kretschmann, e sua avó era a Baronesa Jenny von Sustedt era filha ilegítima de Jérôme Bonaparte, irmão de Napoleão, que era rei de Vestefália.
Lily Braun foi casada com o professor de filosofia, Geog von Gizycki, que era associado ao Partido Social emocrata da Alemanha (SPD), sem no entanto ser um membro do partido. Juntamente com ele, ela estava envolvida no movimento de ética, que procurou estabelecer um sistema de moralidade no lugar das religiões tradicionais. Após a morte do marido, ela se casou em 1896 com Heinrich Braun (1854-1927), que foi um político social-democrata e um publicitário.
Lily Braun juntou ao SPD em tenra idade e se tornou uma das líderes do movimento feminista alemão.  Ela pertencia à oposição ao revisionismo dentro do SPD. Os revisionistas não acreditavam nas teorias do materialismo histórico e sim na adaptação gradual da sociedade, ao invés de uma revolução socialista.
Lily foi fortemente influenciada por Friedrich Nietzche e queira que o SPD se concentrasse no desenvolvimento da personalidade e individualidade, em vez de nivelar todos. As mulheres devem ter a sua própria personalidade e não deve apenas serem consideradas como (futuras) mães e esposas. Ela queria a independência econômica para as mulheres ea abolição do casamento legal.
Morreu após uma longa doença, em 8 de agosto de 1916.


Em 1982, Chico Buarque e Edu Lobo compuseram una cancionita à bela moça:



terça-feira, 15 de março de 2011

EXISTENCIAL IDADES: Des vende se


Curiosos, vasculhadores de vida alheia, perguntam:
- Por onde andastes?
Querem realmente saber? Vos digo, andei me prostituindo, entregando-me às mesquinharias do sistema. E o pior: com contrato e carteira assinada!


sábado, 12 de março de 2011

FEMINIL IDADES: A frente do pensamento de Freud, Nietzsche e Rilke: Lou Andreas-Salomé

Lou Andreas-Salomé, nascida Louise von Salomé (São Petesburgo, 12/02/1861 — Gotinga, 5/02/1937) foi uma intelectual alemã, nascida na Rússia. Lou Andreas-Salomé foi uma bela mulher que escandalizou a sociedade e quebrou regras morais.


"Um caracol que se arrasta alegremente em linha reta diante de si, carregando a sua casa nas costas. Essa casa lhe pertence, mas empurra do caminho todo tipo de coisas que ele deseja e das quais necessita para se tornar um caracol adulto, perfeito, capaz de viver".

Lou Andreas-Salomé

sexta-feira, 11 de março de 2011

CANTADA: Os escafandristas na cidade submersa


E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos


quarta-feira, 9 de março de 2011

CANTADA: Pra tudo se acabar na quarta-feira

E da lama... eis que surge a alegria!

                               
                      São Luiz do Paraitinga inundada no Carnaval de 2010.


                          Bloco do Juca Telles - São Luíz do Paraitinga - 2011

terça-feira, 8 de março de 2011

FEMINIL IDADES: Sustento da vida criativa - Mulheres que correm com lobos



As águas claras: o sustento da vida criativa

         

(...) A força criadora escorre pelo terreno da nossa psique à Procura de depressões naturais, os arroyos, os canais que existem em nós. Nós nos tornamos seus afluentes e sua bacia. Somos suas piscinas naturais, suas represas, córregos e santuários. A força criadora selvagem escorre para todos os leitos de que dispomos, aqueles com que nascemos bem como aqueles que escavamos com nossas próprias mãos. Não temos de enchê-los. Basta que os formemos.

Uma vez que esse imenso rio subterrâneo tenha encontrado seus estuários e afluentes na nossa psique, nossa vida criadora tem cheias e vazantes, sobe e desce com as estações, exatamente como um rio natural. Esses ciclos propiciam que as coisas sejam criadas, alimentadas, que recuem e definhem, tudo a seu próprio tempo e repetidas vezes.

Por esse motivo, a capacidade criadora da mulher é seu trunfo mais valioso, pois ela é generosa com o mundo externo e nutre a mulher internamente em todos os níveis: psíquico, espiritual, mental, emocional e econômico. A natureza selvagem derrama-se em possibilidades ilimitadas, atua como um canal de vida, revigora, mitiga a sede, sacia a nossa fome pela vida profunda e selvagem. Seria ideal que esse rio criador não fosse represado, não sofresse desvios nem fosse mal utilizado.

Se ansiamos pela energia criadora; se temos problemas para alcançar os aspectos férteis, imaginativos, formadores de idéias; se temos dificuldade para nos concentrarmos no nosso sonho pessoal, para agir de acordo com ele ou para garantir sua execução, então alguma coisa deu errado no ponto de união das águas das cabeceiras e dos afluentes de um rio. Ou pode ser que as águas criadoras estejam correndo por um meio poluente no qual as formas de vida da imaginação são eliminadas antes que possam atingir a maturidade. Com enorme freqüência, quando uma mulher se vê despojada da sua vida criativa, todas essas circunstâncias estão no cerne da questão.

Já que a Mulher Selvagem é Río Abajo Río, o rio por baixo do rio, quando ela corre dentro de nós, nós corremos. Se a abertura dela até nós for bloqueada, nós ficamos bloqueadas. Se sua corrente estiver envenenada pelos nossos próprios complexos negativos internos ou pelas pessoas que nos cercam, os delicados processos que forjam nossas idéias também ficam poluídos. Passamos, então, a ser como um rio que morre. Isso não é coisa ínfima, a ser ignorada. A perda do nítido fluxo criador constitui uma crise psicológica e espiritual.

Quando a criatividade fica estagnada de uma forma ou de outra, o resultado é sempre o mesmo: uma fome desesperada pelo novo, um enfraquecimento da fecundidade, uma falta de espaço para as formas menores de vida se localizarem nos interstícios das formas maiores de vida, uma impossibilidade de que uma idéia fertilize uma outra, nenhuma ninhada, nenhuma vida nova. Nessas circunstâncias, sentimo-nos doentes e queremos seguir adiante. Vagueamos sem destino, fingindo poder sobreviver sem a exuberância da vida criativa, mas não podemos nem devemos. Para trazer de volta a vida criativa, as águas têm de ficar claras e límpidas de novo. Precisamos entrar na lama, purificá-la dos elementos contaminadores, reabrir passagens, proteger a corrente de danos futuros.(...)
ESTÉS, Clarissa Pinkola. Mulheres que correm com lobos. Rocco, 1994.

CANTADA - EXISTENCIAL IDADES - Dylan, Clay e Lennon